Desde que o blog foi criado, tenho postado textos, vídeos, artigos e outros tipos de materiais que falam a respeito do suicídio, sua prevenção e posvenção. Todo tipo de material que comecei a colher desde que comecei minha pesquisa.
Hoje, porém, é um sábado especial. Chega mais um dia 10 de setembro, momento em que iniciativas mundiais darão destaque à importância de olhar o suicídio como um problema de saúde pública, que pode ser cuidado, até mesmo prevenido, e que para isso deve ser olhado e discutido - não apenas pelos profissionais de saúde, pelos voluntários do CVV, pelas pessoas que estão em sofrimento, que fizeram uma tentativa ou tem pensado em desistir da própria vida, ou aqueles que perderam entes queridos - mas por todos.
Por isso, hoje essa postagem é pessoal, e vou tentar fazer um resumo de tudo o que tenho pensado ao longo desses quatro anos de trabalho, pesquisa e estudo sobre o tema.
A postagens do blog frequentemente acontecem aos domingos, e são, em sua maioria, publicações de autoria de outras pessoas ou trechos dos meus trabalhos. São também poesias, cartas, textos, que trazem um olhar de quem alguma vez pensou em desistir ... Porque penso que às vezes abordar estatísticas, diagnósticos que associam o suicídio a transtornos mentais e números são dados importantes para nos aproximar da dimensão e da importância do fenômeno ... mas que por outro lado, às vezes nos distanciam da dimensão única de cada vida que se perde ou que é afetada quando alguém se mata. Então, busco sempre trazer a imensidão que cada vida tem e que não pode ser esquecida.
O Efeito Titanic
James Cameron fez Titanic, um filme que é um dos meus preferidos, e que às vezes a gente lembra da famosa cena do Jack congelado (cabia ou não o Jack em cima daquela porta, evitando sua morte?) ... do navio afundando ...
James Cameron fez Titanic, um filme que é um dos meus preferidos, e que às vezes a gente lembra da famosa cena do Jack congelado (cabia ou não o Jack em cima daquela porta, evitando sua morte?) ... do navio afundando ...
Mas às vezes esquece que a primeira vez que Rose e Jack se encontram, justamente é quando Rose está prestes a se jogar do navio ... cansada de viver em um mundo no qual se encaixava ... E em poucos dias encontra uma força de vida que se mantém, mesmo quando seria mais fácil simplesmente fechar os olhos e dormir para sempre, de mãos dadas com Jack, que foi quem mostrou a ela que valia a pena viver.
Cabe dizer que o amor nem sempre vai ser o suficiente para continuar a viver - como trouxe o livro e o filme "Como eu era antes de você" ... mas quando eu cito o Titanic, quero dizer que talvez não tenhamos chorado pela vida de mais de 1.500 pessoas que morreram no navio ... Mas choramos por Jack ... e pela perda de Rose. Porque nos permitimos nos aproximar da vida, dos sonhos e dores deles ... por isso, acho que quando olhamos para a prevenção do suicídio, não podemos nos esquecer de cada pessoa que se encontra ali. E que por isso, dizer que a pessoa "só poderia estar louca para fazer isso", "foi egoísta", "foi um fraco", "tem depressão" ... é simplificar uma questão que é muito ampla - como tudo aquilo que se refere ao que é humano.
Meu primeiro contato com o suicídio, no campo profissional, foi no meu trabalho em um serviço de Atenção Psicossocial, contato que me motivou a pensar na criação de um protocolo para estes casos, e que o percurso da pesquisa no Mestrado Profissional me permitiu perceber que pensar em estratégias fechadas, sem pensar na sensibilização dos profissionais de saúde, no tabu da morte e do suicídio em nossa sociedade, sem levar em conta a própria organização dos processos de trabalho, entre outras questões, não seria possível. Toda esta jornada está disponível na dissertação "Cuidado, frágil: aproximações e distanciamentos de trabalhadores de um CAPS na atenção ao suicídio", disponível em: http://www2.unifesp.br/centros/cedess/mestrado/baixada_santista_teses/027_bx_dissertacao_lucianacescon.pdf.
Por outro lado, ao longo deste tempo continuei pesquisando, participando de eventos sobre o suicídio, fazendo cursos, oferecendo palestras ... Recentemente tornei-me voluntária do CVV (http://cvv.org.br/), oferecendo escuta através do chat ... Tornei-me membra-fundadora da ABEPS (Associação Brasileira de Estudos e Prevenção do Suicídio)http://www.abeps.org.br/.
Fui convidada para ser colaboradora do Instituto Vita Alere (http://www.vitaalere.com.br/), a convite da Karen Scavacini, que tem por missão, entre outros objetivos:
"Promover a prevenção e a posvenção do suicídio, por meio de ações de divulgação, conscientização, educação, pesquisa, apoio e tratamento.
Habilitar profissionais da saúde, para manejo em crise suicida.
Minimizar o sofrimento das pessoas e oferecer suporte psicológico e psiquiátrico em situações de comportamento suicida e luto por suicídio.
Atualmente, não me considero uma especialista na prevenção do suicídio, mas uma estudiosa ... e militante."
E todas essas experiências tem me acrescentado muito, e me fazem acreditar cada vez mais que é necessário falar sobre o assunto, principalmente para que as pessoas que encontram-se em sofrimento possam saber onde encontrar ajuda.
No telefone do CVV (141), nos serviços de Saúde Mental/Atenção Psicossocial, nos profissionais de Psicologia, Psiquiatria, etc ...
Bom saber também que várias pessoas estão fazendo pesquisas a respeito da prevenção e posvenção em suicídio, campo que tem se ampliado cada vez mais. Mas é importante lembrar que o suicídio também deve ser discutido nos cursos de Graduação, especialmente nas formações em saúde. Minha experiência e a de vários colegas de Psicologia é de que não se fala a respeito de morte, luto e suicídio. Com certeza nem todas as pessoas que atenderemos em nosso exercício profissional terão algum tipo de psicopatologia ... mas todos nós passamos por experiências de perda ao longo da vida, e no entanto, não somos preparados para lidar com isso.
E que cabe pensar em prevenção, em cuidados em saúde mental, em lidar com frustrações, comunicar sentimentos e ser resiliente desde os primeiros anos de vida, como promoção de saúde.
E que cabe pensar em prevenção, em cuidados em saúde mental, em lidar com frustrações, comunicar sentimentos e ser resiliente desde os primeiros anos de vida, como promoção de saúde.
Outro aspecto que acho fundamental é a importância da capacitação, formação e sensibilização dos profissionais que vão atender a essas pessoas ... Os serviços e profissionais devem estar preparados para olhar para esta questão, com sensibilidade, oferecendo escuta e acolhimento ... Como eu sempre digo: não olhe para o suicídio, a fala do desejo de morte ... Antes de tudo, olhe para o sofrimento daquela pessoa, fique ao lado dela. Você não precisa (e provavelmente não conseguirá, ao menos em um primeiro momento) ter respostas ... mas faz toda a diferença mostrar-se disponível e oferecer escuta.
A questão de oferecer sua escuta e acolher o sofrimento cabe em qualquer lugar: nos serviços de atenção básica, na escola, no trabalho ... Quantas vezes percebemos que alguém não está bem e ignoramos, nos afastamos, por não saber o que fazer ... Quando muitas vezes, simplesmente saber que não é invisível já é algo significativo para alguém. O Facebook tem um recurso que permite avisar quando se observa algum sinal de comportamento suicida na comunicação de alguém.
Para aqueles que hoje buscam um sentido para continuar a viver e não estão encontrando, eu gostaria de deixar uma mensagem: Procure ajuda, você não está só. Não é errado nem é pecado pensar em desistir ... mas perceba que essa não é a única opção, e existem pessoas e lugares que podem ajudar você a encontrar outras saídas. Muitas vezes, quando a pessoa pensa em suicídio, ela não quer desistir da vida, mas sim não aguenta mais sentir a dor que está sentindo. Para algumas dores, não há cura ... mas é possível diminui-la, aprender a conviver com ela e encontrar lugares onde ela possa ser cuidada.
E para aqueles que tentaram ou de fato consumaram a morte ... não cabe julgar ... Nem dizer que foi um ato de covardia ou de coragem ... pois não cabem tais conceitos. Caberá sempre nosso respeito, nossa compaixão e nossa mão estendida.
Luciana França Cescon - Psicóloga - CRP 06/98.202
Email: lucianacescon@yahoo.com.br
Luciana França Cescon - Psicóloga - CRP 06/98.202
Email: lucianacescon@yahoo.com.br
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