Helena Bertho
Do UOL, em São Paulo
30/03/2017
"O que eu faço?". A dúvida angustiada foi a primeira coisa que passou pela cabeça da tradutora paulistana Alessandra Siedschlag, 45 anos, ao ler no Facebook uma mensagem de despedida de Aline*. No post, a amiga de infância da tradutora deixava clara a intenção de se matar -"digam para minha filha que a amo", foi o trecho que mais lhe chamou a atenção. Dos 60 amigos na rede social, só mesmo Alessandra não ficou parada. Primeiro tentou ligar para Aline, que não atendeu o celular. Então chamou a polícia.
"Os policiais me informaram que eu deveria estar junto quando a viatura chegasse ao prédio. Só que eu morava do outro lado da cidade e tive medo de não aparecer a tempo para evitar o pior", conta Alessandra, que pegou um táxi, desesperada. "Chegando lá, o síndico não queria autorizar nossa ida ao apartamento, nem permitir que a porta fosse arrombada". Depois de muita insistência, os policiais conseguiram subir e Aline foi encontrada no chão da sacada, desacordada. A tela de proteção da varanda do apartamento, no 13º andar, estava cortada.
"Ela foi levada para o hospital na própria viatura, não houve tempo nem para esperar uma ambulância. Lá foi atendida e sobreviveu", recorda Alessandra, aliviada. "No dia seguinte, a Aline me agradeceu. Contou que havia sido um ato de desespero.
Quem quer mesmo se matar manda aviso?
Mensagens como as de Aline vêm se tornado cada vez mais comuns nas redes sociais. São postagens em tom de desabafo, que sugerem a intenção de suicídio. Só este mês, três casos como o da amiga de Alessandra ganharam a mídia: dois em Santa Catarina e outro no Piauí. Felizmente, em todos o socorro chegou a tempo.
Segundo dados do Ministério da Saúde, um brasileiro comete suicídio a cada 45 minutos. No entanto, de acordo com o levantamento, 90% dessas mortes poderiam ser evitadas, se o resgate acontecesse em tempo hábil. Por isso, mensagens assim nunca devem ser ignoradas. "Existe um mito de que quem realmente quer se matar não manda aviso. Mas todo comentário de suicídio deve ser levado a sério", explica a psicóloga Karen Scavacini, do Instituto Vita Alere, de prevenção ao suicídio. "Em alguns casos, talvez seja mesmo um pedido de atenção. Mas é, sobretudo, a comunicação de um sofrimento extremo, que não deve ser desprezada."
Mas tomar uma atitude, como fez Alessandra, nem sempre é fácil. Muitas pessoas se vêm paralisadas ao ler um post suicida no Facebook. "É comum ter medo de invadir a privacidade do outro, especialmente se aquele 'amigo virtual' não é tão próximo assim na vida real. Ou ainda ouvir que a pessoa quer mesmo se matar e não saber o que fazer", afirma Karen.
Mas o que eu posso fazer? Se um amigo, parente ou conhecido indicou nas redes sociais que está pensando em tirar a própria vida, a primeira atitude que você deve ter é tentar conversar. "Pergunte o que está acontecendo, se ela precisa de ajuda. Esteja preparado para ouvir coisas que nem imagina, sem julgar ou criticar", diz a voluntária o Centro de Valorização da Vida (CVV), Adriana Rizzo. "É importante que isso seja feito de maneira privada, sem expor a pessoa em comentários ou postagens públicas. Dependendo da sua proximidade com aquela pessoa, ligue para ela."
Quando se sente sozinho, alguém com problemas sérios e disposto a cometer o pior, não vê saídas. "Conversar com alguém pode ajudar a diminuir a ansiedade e a angústia", ressalta Adriana, que também orienta a não se afastar da pessoa depois dessa primeira conversa. "Nunca diga que a pessoa é louca, não duvide do que ela diz, não sugira que vai passar, não compare o problema dela aos seus".
Além disso, contar uma história sua similar, que seja positiva, pode ser bom. Segundo a psicóloga, "isso pode trazer uma sensação de compreensão e de acolhimento. Mas não diga que o jeito que você fez que é o certo, apenas deixe claro que as coisas podem dar certo". As especialistas também orientam a nunca manter sigilo e avisar pessoas próximas para que também ajudem.
Quando a ação deve ser rápida
Em alguns casos, como o da amiga de Alessandra, é preciso tomar uma atitude mais imediata. Algumas mensagens deixam claro que a pessoa está prestes a agir e agora os vídeos ao vivo também tem sido feitos dos preparos do potencial suicida. No caso de uma publicação em texto, ligue para a pessoa para checar como está. Caso ela não atenda, acione familiares ou amigos que morem próximos para que possam chegar junto com a polícia e os bombeiros. Já no caso dos vídeos, não é preciso checar com a pessoa como está. Na hora acione a emergência e vá até o local, ou peça para alguém ir.
O próprio Facebook conta com ferramentas para ajudar nesses casos. Ao ver mensagens que indiquem tendências suicidas ou de automutilação, você pode clicar em "denunciar publicação", em seguida selecionar "acredito que não deveria estar no Facebook", para, por fim, escolher a opção relacionada a suicídio. Ao fazer isso, o autor da publicação receberá uma mensagem dizendo que um amigo está preocupado e oferecendo algumas opções de ajuda, entre elas o contato do CVV e dicas do que fazer.
Já quando você se deparar com um vídeo ao vivo que indique a intenção de suicídio, ao fazer a denúncia as imagens vão diretamente para análise de um funcionário do Facebook que entra em contato com as autoridades responsáveis. Foi através desse mecanismo que, no último dia 8, a polícia de Santa Catarina conseguiu impedir a morte de um mecânico desempregado, que foi encaminhado para atendimento psiquiátrico e com a assistência social.
"Esse homem fez um vídeo ao vivo em que dizia que ia se matar. O Facebook identificou e entrou em contato com a polícia americana, que nos procurou. Nós então fizemos uma busca por informações do homem e encontramos seu endereço. Acionamos a polícia miliar da cidade em que vive, e conseguimos chegar até ele a tempo de impedir que ele se enforcasse", conta o agente de polícia Ivan Castilho, que participou da ação.
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