domingo, 26 de agosto de 2018

Livro: Sem tempo de dizer adeus _______________ Carla Fine

Dica da Camila Appel (da página Morte sem tabu https://www.facebook.com/mortesemtabu), este livro fala do luto de pessoas que perderam seus entes queridos por suicídio.

Dá um nó na garganta, sim. A delicadeza do texto, com tantas histórias coletadas pela jornalista Carla Fine, que perdeu seu marido, não impede que a gente fique impactada pela dor dos sobreviventes enlutados. Mas é muito importante falar cada vez mais sobre o cuidado para quem sobrevive depois de um suicídio, para diminuir o estigma e apoiar aqueles que ficam depois de uma perda desta magnitude, "sem tempo de dizer adeus".

A autora fala muito sobre a importância de participar de grupos de apoio: "Pensei no estranho vínculo que une os sobreviventes do suicídio. Embora cada uma das situações seja única, todos passamos por etapas semelhantes em nosso processo de luto. Quando conhecemos alguém que passou por isso, nosso caos pessoal e nosso segredo parecem um pouco menos assustadores.
O suicídio é diferente das outras mortes. Nós, os que ficamos para trás, não podemos dirigir nossa raiva à injustiça de uma doença mortal, de um acidente aleatório ou de um assassino desconhecido. Em vez disso, sofremos pela mesma pessoa que tirou a vida de nosso ente querido. Antes de começar a aceitar nossa perda, precisamos lidar com as razões dela - e com o reconhecimento gradual de que talvez nunca saibamos o que aconteceu, nem por quê" (p. 13-14).

Ao abordar as especificidades do luto por suicídio, a autora explica:

"No meu luto, eu também queria ser igual a todo mundo. Queria que minha família e meus amigos me consolassem, e não me questionassem sobre os motivos de Harry ter se matado. Eu queria sofrer a ausência do meu marido, não analisar seus motivos para morrer. Eu queria celebrar sua bondade e amizade ao longo de 21 anos de casamento, não ficar com raiva dele por me abandonar no auge de nossa vida.

O suicídio de uma pessoa querida nos transforma de maneira irreversível. Nosso mundo fica em pedaços, e nunca mais seremos os mesmos. A maioria de nós se adapta, aprendendo finalmente a transitar num terreno em cuja segurança deixamos de confiar. Aceitamos, gradualmente, que nossas perguntas não serão respondidas. Tentamos evitar nos torturar por não ter conseguido prever a catástrofe iminente nem impedir que nossos entes queridos tirassem a própria vida" (p. 19-20).     

O livro vale muito a leitura, e a autora termina com a seguinte reflexão:
"Numa jornada cheia de pontos de referência desconhecidos e reviravoltas inesperadas, aqueles de nós cujos entes queridos puseram fim à vida de forma tão abrupta e com tanta angústia não hesitam diante de uma certeza incontestável: nós temos muita saudade de nossas mães e irmãs, de maridos e filhas, de irmãos e filhos, mulheres e pais, parentes e amigos. No entanto, nossa sobrevivência - e mesmo nossa vitória - é o legado que levamos adiante, um tributo à memória daqueles que nós amamos e inexplicavelmente perdemos" (p. 209).



domingo, 19 de agosto de 2018

Técnica Kit de Esperança

Conheci esta atividade no livro "Terapia cognitivo-comportamental para pacientes suicidas", de Wenzel, Brown e Beck. Os autores referem que pessoas com ideação suicida e/ou desesperança, "quando estão em um estado emocionalmente carregado apresentam dificuldades em pensar nas razões para viver, o que aumenta a probabilidade de engajarem-se em um ato suicida. Portanto, é importante que eles tenham um fácil acesso a lembretes de razões para viver quando estão em crise".

O kit de esperança (ou caixinha de primeiros socorros emocional) "é um auxílio para a memória que consiste em uma coleção de itens significativos que lembram aos pacientes de razões para viver e que pode ser acessado em momentos de crise. Os pacientes muitas vezes localizam algo simples, como uma caixa de sapatos, e então armazenam itens como fotografias, cartões postais e cartas. Os pacientes comumente incluem poemas inspiradores ou religiosos. Por exemplo, um kit de uma paciente consistia em figuras de seus filhos e de seu cachorro, uma pintura a dedo que seu neto havia feito para ela, uma carta de um amigo, música inspiradora em um cd, uma passagem da Bíblia e uma carta de oração. Ela decorou a caixa com o seu neto e colou palavras e figuras inspiradoras na parte de fora da caixa. Ela então colocou o kit em um local evidente em sua casa".

Dentro do processo terapêutico, esta é uma técnica que pode ser utilizada como recurso concreto para identificar razões para viver. A própria decoração da caixa (com pintura, colagem, etc) pode ser uma das etapas do processo (a caixinha de ontem eu comprei pronta).

Novos objetos e cartões de enfrentamento (outra técnica da TCC) podem ser incorporados ao kit ao longo da psicoterapia.

Na minha experiência, esta é uma técnica muito prazerosa para os pacientes, por mobilizar afetos, memórias positivas e estimular projetos futuros (se ele não consegue identificar muitas coisas boas hoje, pode representar lugares que quer conhecer, experiências que quer viver, citações) ...




domingo, 5 de agosto de 2018

Se _______________________________________________ Bráulio Bessa


Li o livro "Poesia que transforma, do Bráulio Bessa, e no final ele colocou algumas mensagens que recebeu de pessoas que ouviram suas poesias encantadoras no programa "Encontro com Fátima Bernardes".

Uma delas é esta:

"Da última vez que tive pensamentos suicidas ouvi seus poemas'Se' e 'Recomece', e eles me fizeram desistir,levantar a cabeça e seguir em frente. Seus poemas me fortalecem cada dia mais. [...] Você é uma grande inspiração pra mim. E seu livro é extraordinário. Obrigada por me fazer insistir" (p. 179).

Então, hoje compartilho o vídeo e o texto.




"E se ninguém me der força
E se ninguém confiar
E se eu for invisível
E se ninguém me enxergar
e se eu perder a fé
Se eu não ficar de pé
Se eu voltar a cair
Se a lágrima escorrer
Se, por medo de sofrer
eu pensar em desistir.

E se quando eu cair
ninguém me estender a mão.
E se quando eu me perder,
sem rumo, sem direção.
Se eu não achar o caminho
Se eu estiver sozinho
no labirinto da vida.  
E se tudo for escuro
Se eu não vir um futuro 
na estrada a ser seguida

E se esse tal futuro 
for pior do que o presente
E se for melhor parar 
do que caminhar pra frente
E se o amor for dor
E se todo sonhador 
não passar de um pobre louco
E se eu desanimar, 
se eu parar de sonhar, 
queda a queda, pouco a pouco.

E se quem eu mais confio 
me ferir, me magoar
E se a ferida for grande
E se não cicatrizar
Se na hora da batalha 
minha coragem for falha
Se faltar sabedoria
Se  a derrota chegar
E se ninguém me abraçar 
na hora da agonia.

E se for tarde demais
E se o tempo passar
E se o relógio da vida 
do nada se adiantar
E se eu avistar o fim 
chegando perto de mim,
impiedoso e veloz, 
sem poder retroceder, 
me fazendo perceber 
que o SE foi meu algoz.

E se eu pudesse voltar ...
Se o SE fosse diferente
Se eu dissesse pra mim mesmo:
“Se renove”, “Siga em frente”, 
“Se arrisque”, “Se prepare”, 
E se cair jamais pare
 “Se levante”, “Se refaça”, 
“Se entenda”, “Se conheça”
E se chorar, agradeça 
cada vez que achou graça.

Se desfaça da preguiça, 
do medo, da covardia
Se encante pela chance 
de viver um novo dia
Se ame e seja amor
Se apaixone, por favor
Se queira e queira bem
Se pegue, se desapegue, 
Se agite e desassossegue
E se acalme também.

Se olhe, se valorize 
E se permita errar
Se dê de presente a chance 
de pelo menos tentar
Se o “SE" for bem usado,
o impossível sonhado 
pode se realizar.


- Bráulio Bessa em "Poesia que transforma"